Negócios
Reoneração gradual da folha de pagamentos traz insegurança jurídica, dizem empresários
Entidades de classe divulgaram carta em que destacam que medida provisória "contraria decisão soberana" do Congresso
Última atualização: 17/06/2024 10:35
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, anunciou, nesta quinta-feira (28), medidas para compensar perdas de arrecadação ocasionadas por "derrotas" do governo federal no Congresso, em especial a derrubada do veto presidencial que acabava com a desoneração da folha de pagamentos de 17 setores da economia, entre eles o coureiro-calçadista. Uma dessas ações diz respeito a uma reoneração gradual da folha – medida provisória, que deve ser publicada ainda neste ano, substituirá a desoneração total (substitui o pagamento de 20% sobre a folha de salários por 1% a 4,5% da receita bruta das emrpesas), passando a oferecer uma isenção fiscal somente sobre o primeiro salário mínimo recebido pelo trabalhador. Logo após o anúncio desta quinta, 19 entidades empresariais, incluindo a Associação Brasileira das Indústrias de Calçados (Abicalçados) e o Centro das Indústrias de Curtumes do Brasil (CICB), divulgaram uma carta intitulada "Manifestação sobre a Desoneração da Folha de Pagamento e o anúncio de Medida Provisória pelo Ministério da Fazenda". No documento, as instituições destacam que a medida provisória "contraria uma decisão soberana do Congresso Nacional, ratificada pelas duas Casas na derrubada ao veto presidencial. Além disso, a medida traz insegurança jurídica para as empresas e para os trabalhadores já no primeiro dia do ano de 2024".
Na carta, as entidades de classe observam que a Lei nº 14784/23, que prorroga a desoneração da folha de pagamentos por quatro anos, foi publicada nesta quinta no Diário Oficial da União (DOU), "tendo sido aprovada com expressiva maioria" no Congresso Nacional. "Não é, em absoluto, razoável que ela seja imediatamente alterada ou revogada por meio de uma medida provisória, contrariando uma decisão soberana do Congresso Nacional, ratificada pelas duas Casas na derrubada ao veto presidencial".
As entidades de classe classificam a desoneração como uma "troca de base de incidência tributária". "Essa política tem se mostrado, desde seu início em 2011, extremamente benéfica para o Brasil". Citam dados do Caged, demonstrando que, no período de janeiro de 2019 a agosto de 2023 (antes, durante e após a pandemia de Covid-19), os 17 setores incluídos aumentaram em 18,9% seus empregos formais, enquanto os demais setores criaram 13% a mais de vagas, uma diferença de quase seis pontos percentuais.
"Mais de 9 milhões de trabalhadores com carteira assinada"
Segundo as instituições, os 17 setores da economia beneficiados pelo desoneração da folha de pagamentos empregam hoje, com carteira assinada, mais de 9 milhões de trabalhadores, tendo gerado mais de 300 mil postos de trabalho em 2023 (até agosto). "São setores altamente intensivos em mão de obra, cujas folhas de pagamento têm um alto peso em sua composição de custos. A política de desoneração da folha diminui esse custo, sendo indubitavelmente um mecanismo para esses setores empregarem mais e, ponto importante, de maneira formal", diz a carta.
"Mais arrecadação"
As entidades citam no documento que a política de desoneração "gera mais arrecadação para a Previdência Social, mais imposto de renda, mais recolhimento para o FGTS e menos custos sociais como auxílio-desemprego, por exemplo". "Em 2022, estima-se que a arrecadação adicional gerada por essa política foi da ordem de R$ 22 bilhões, incluindo R$ 2,4 bilhões de arrecadação adicional de Cofins-Importação por uma alíquota adicional de 1% estipulada pela própria lei da desoneração", detalham as associações no documento.
"Reavaliações de projetos que não deram certo"
Nesta quinta, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, disse que as medidas para compensar as perdas de arrecadação "são reavaliações de projetos que não deram certo". "Estamos repondo uma perda de arrecadação para cumprir os objetivos do marco fiscal”, afirma. Ele disse que não está prevista nenhuma arrecadação adicional, além do que foi perdido com as "derrotas" no Congresso.
O objetivo principal é “repor as condições do orçamento apresentado” neste ano, afirmou Haddad. A Lei Orçamentária Anual recentemente aprovada prevê, por exemplo, déficit zero para as contas públicas no ano que vem. “Estamos botando ordem no orçamento”, reiterou o ministro da Fazenda.
A medida provisória com os detalhes do que será feito deve ser publicada ainda neste ano, garantiu Haddad, uma vez que todas as propostas já passaram pelo crivo da Casa Civil. O ato deve ser assinado a qualquer momento pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, disse o ministro da Fazenda.
Reoneração gradual
Haddad afirmou que a reoneração gradual da folha de pagamentos visa concentrar o benefício no "grosso" da força de trabalho, cuja maioria ganha até dois salários mínimos. Segundo as projeções da Fazenda, a medida deve recuperar R$ 6 bilhões dos R$ 12 bilhões que seriam perdidos com a desoneração total sobre a arrecadação federal.
Ele voltou a chamar a desoneração total da folha de pagamentos de alguns setores de “privilégio” e frisou que a medida, que seria temporária, não cumpriu o objetivo de aumentar as vagas de emprego.
“O emprego desses 17 setores caiu. Essa medida foi tomada em 2011 para ser temporária, e os setores, no cômputo geral, desempregaram. Aquela ideia original de que aumentaria o emprego se mostrou errada”, observa.
Segundo o Ministério da Fazenda, a derrubada do veto à desoneração da folha e ao benefício para pequenos municípios custaria R$ 25 bilhões no próximo ano. Desse total, de R$ 7 bilhões a R$ 11 bilhões correspondem ao incentivo para as prefeituras de pequeno porte.