Duplo mandato no Banco Central

16.11.2020

O Senado Federal aprovou o projeto de autonomia do Banco Central (BC) que agora segue para exame da Câmara dos Deputados. A questão já vem há muito tempo sendo debatida, contudo, é importante deixar claro que o projeto não concede ao BC a independência formal que constava no plano de governo apresentado por Jair Bolsonaro nas eleições.

O próprio autor do projeto de lei, o senador Plínio Valério, diz: “o meu projeto não torna o Banco Central independente. É autonomia para que o presidente do BC não seja demitido da noite para o dia e possa executar o que foi traçado”.

De fato, independência formal é outra coisa e, se aprovada, transformaria o BC em um quase quarto poder da República. A autonomia busca apenas conceder um mandato fixo e a estabilidade no cargo ao presidente e aos membros da diretoria do Banco Central, fornecendo uma espécie de blindagem institucional, dando segurança para a implantação da política monetária que se considere mais adequada.

Com a autonomia, o Banco Central passa a ser classificado como uma autarquia especial caracterizada pela ausência de vinculação a qualquer Ministério. Porém, de todos os aspectos no projeto de lei, o mais relevante para a condução da política monetária brasileira é a alteração prevista nas funções a serem executadas pelo BC. Atualmente, a função do Banco Central do Brasil é “assegurar a estabilidade do poder de compra da moeda e um sistema financeiro sólido e eficiente”, todavia, a proposta aprovada agora pelo Senado introduz o chamado duplo mandato, aos moldes do que é feito pela Reserva Federal.

A ideia é que, sem prejuízo à meta principal (o controle da inflação), o BC terá também o objetivo de “suavizar as flutuações do nível de atividade econômica e fomentar o pleno emprego”. Para que o leitor possa compreender melhor esta questão, hoje, caso o nível geral de preços ameace romper o teto da meta de inflação, o BC pode executar uma política monetária restritiva (leia-se uma forte elevação da taxa básica de juros) para manter a inflação dentro da meta, mesmo que isso represente deprimir o nível de atividade econômica e elevar o desemprego.

Com o duplo mandato, a definição da taxa básica de juros deverá ser fixada pelo Comitê de Política Monetária do Banco Central observando não só a trajetória presente e esperada dos preços, mas também as condições do mercado de trabalho e do ritmo de atividade econômica. É certo que, além de ter que passar pelo crivo da Câmara dos Deputados, há ainda muitas questões para serem definidas. O fato é que, se aprovada a inclusão do duplo mandato, trará reflexos na condução da política monetária brasileira. É aguardar para ver.

Orlando Assunção Fernandes

Orlando Assunção Fernandes é economista, mestre em Economia Política e doutor em Teoria Econômica pelo Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP).

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