Riscos fiscais da pandemia

22.06.2020

O Banco Mundial, em um recente relatório intitulado Global Economic Prospects, prevê que em 2020, devido aos efeitos econômicos decorrentes da pandemia da Covid-19, mais de 90% das economias mundiais entrarão em recessão, proporção maior até mesmo do que na grande depressão dos anos 1930. A pandemia que, no momento em que escrevo, já se aproxima da marca do um milhão de infectados e dos 45 mil mortos no Brasil, produzirá uma queda de 8% do PIB brasileiro em 2020.

De acordo com o Banco Mundial, entre os vários riscos à economia brasileira, estão o desequilíbrio das contas públicas e a consequente aceleração do endividamento nos próximos anos. O pagamento do auxílio emergencial, o socorro do governo federal aos estados e municípios, os gastos com a aquisição de equipamentos hospitalares e a concessão de subsídios às empresas para a manutenção de empregos são apenas alguns exemplos de medidas que trarão severos impactos às finanças públicas.

De acordo com o Ministério da Economia, o País terminará o ano com um déficit nas contas públicas de R$ 601,2 bilhões. Tal projeção tinha como cenário base uma queda de 5% do PIB em 2020. Se a queda for maior, como revela o relatório do Banco Mundial, o rombo será ainda mais elevado e produzirá, inexoravelmente, forte pressão sobre a trajetória do endividamento público brasileiro, cuja relação dívida bruta/PIB, importante indicador do peso da dívida sobre a economia de um país, e que se encontrava em elevação antes mesmo da pandemia, poderá chegar à casa dos 100% do PIB já em 2021.

Uma análise mais detida sobre esta dívida revela que, afora o elevado valor como proporção do PIB, o perfil desta dívida também se mostra preocupante. Boa parte da dívida pública corresponde à chamada dívida mobiliária federal (títulos públicos negociados no mercado local e que podem ser adquiridos no Tesouro Direto) e esta parcela apresenta elevado custo (9,3% a.a. em média) e curto prazo de vencimento (46 meses em média) o que confere ares de dramaticidade ao ato de carregar uma dívida tão expressiva.

Honrar tal dívida acabará desviando parte significativa da arrecadação do Estado ao pagamento de juros em uma perversa forma de redistribuição de renda, especialmente porque a disponibilidade de recursos destinados a políticas públicas e a investimentos serão insuficientes para alargar os quase endêmicos gargalos sociais e estruturais de nosso País. Como se pode depreender, além dos impactos na atividade econômica, a crise provocada pela Covid-19 apresentará também riscos fiscais, cujos reflexos serão percebidos durante muito tempo.

Orlando Assunção Fernandes

Orlando Assunção Fernandes é economista, mestre em Economia Política e doutor em Teoria Econômica pelo Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP).

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