Subprime e Covid-19: diferenças e similaridades

27.05.2020

Quinze de setembro de 2008. Foi neste dia que o banco americano Lehman Brothers abriu falência, sendo o estopim daquela que foi tida, ao menos até ali, como a maior crise econômica desde a depressão dos anos 1930. Infelizmente, vivemos atualmente outra crise global, esta de ordem sanitária, mas que também tem produzido severos impactos econômicos mundo afora.

Por causa da gravidade de ambas, muitos têm sido compelidos a comparar a atual crise econômica gerada pelo Covid-19 com aquela oriunda no mercado americano de hipotecas de alto risco (subprime) em 2008/09.

A questão é que apesar de algumas semelhanças, há mais diferenças do que similaridades entre as duas crises. No que tange às semelhanças, podemos dizer que ambas produziram incertezas, derrubaram bolsas e o nível da atividade econômica global, bem como ensejaram a prática de políticas monetárias e fiscais expansionistas.

Todavia, as semelhanças param por aí. A crise de 2008/09 teve origem no mercado financeiro para só posteriormente contaminar a chamada economia real (produção e emprego). Já a atual crise atingiu primeiro a economia real e a oferta produtiva para depois ter repercussões (e por enquanto limitadas) no setor financeiro.

Em 2020 o distanciamento social tem sido o caminho escolhido para enfrentar a crise, provocando assim uma dolosa e deletéria desaceleração econômica, a fim de mitigar a sobrecarga nos sistemas nacionais de saúde e preservar vidas. Já na crise de 2008/09, para se evitar uma ruptura dos mercados financeiros, todas as medidas adotadas buscavam, ao contrário, reativar o mais breve possível a atividade econômica.

Ademais, diferentemente da crise do subprime, os bancos (responsáveis por aquela crise) hoje fazem parte da solução do problema, provendo liquidez através da manutenção das linhas de crédito e da postergação do pagamento de financiamentos anteriormente contraídos.

Em termos de duração, a atual crise gerada pela pandemia do coronavírus provocou uma abrupta queda no ritmo de atividade econômica e aposta é que, após o pico dos contágios, possamos experimentar também uma rápida recuperação econômica, diferentemente do que ocorreu pós-crise de 2008/09 (apesar de não descartarmos que a recuperação possa ser mais lenta do que se deseja).

Outra distinção é a maior celeridade (quando comparada à crise do subprime) com que governos mundo afora reagiram à atual crise com a adoção de políticas monetárias expansionistas (liquidez abundante e juros baixos) e políticas fiscais anticíclicas (estímulos fiscais e programas de transferência de renda).

Em 2020, porém, o receio é que os custos destas políticas venham a ser mais elevados do que foram em 2008/09, tanto no que tange ao resultado das contas públicas, como na trajetória da relação dívida/PIB.

O fato é que, independentemente das semelhanças ou das diferenças, o importante é que desta vez possamos tirar lições, revisando nossos modelos de desenvolvimento e a forma como se tem conduzido a política econômica, a fim de prevenir e/ou dirimir efeitos
de crises vindouras.

Orlando Assunção Fernandes

Orlando Assunção Fernandes é economista, mestre em Economia Política e doutor em Teoria Econômica pelo Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP).

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