É preciso fazer a roda girar

14.10.2019

No mês passado, o Banco Central (BC) reduziu, pela segunda vez consecutiva, a taxa básica de juros em 0,5%. Com esta redução a taxa Selic atingiu sua mínima histórica de 5,5%.

Apesar de ser uma boa notícia, esta decisão deve ser vista com um misto de satisfação e de apreensão.

A satisfação advém do fato de que a inflação vem se mantendo comportada, abaixo do centro da meta, o que tem permitido ao BC executar uma política de afrouxamento monetário, ou seja, de redução da taxa básica de juros.

A apreensão, por sua vez, decorre da constatação de que se a inflação está comportada, isto se deve ao alto grau de ociosidade de uma economia que se apresenta atualmente em ritmo praticamente estagnado, e cujo PIB real, ao final de 2019, será menor do que o de 2013.

As sucessivas quedas da Selic (ao menos outra ainda virá) devem ser entendidas, portanto, a partir de um quadro de baixa inflação (o que, per si, é bom), porém resultante de uma intensa e duradoura crise econômica (o que é péssimo).

A questão é que desde 2016 (quando estava em 14,25%) o BC vem reduzindo a taxa básica de juros e depois de quase 10% de queda a economia teima em não dar sinais de retomada.

Todo o estudante de ciências econômicas aprende que a economia tem quatro grandes forças motrizes: o consumo das famílias, o investimento, o gasto público e o comércio exterior. E, neste momento, nenhuma delas apresenta situação alvissareira.

O Estado vive uma grave crise fiscal que o impede de se utilizar do gasto público como força motriz da economia e o comércio exterior sofre com as fortes tensões comerciais e geopolíticas mundo afora.

O consumo das famílias se apresenta limitado, especialmente devido à difícil situação do mercado de trabalho (como discuti em minha última coluna) e o investimento - a despeito de todas as tentativas de se recuperar a confiança do empresariado através de reformas (trabalhista, previdenciária, etc.) - não se concretiza, haja vista a falta de demanda e a alta ociosidade das plantas industriais já existentes.

O fato é que, de certa forma, a economia se parece com um automóvel. Quando um carro está em seu estado estacionário, o esforço que se faz para movê-lo de 0 a 20 km/h é sempre muito maior do que quando o mesmo veículo está a 80 km/h e se o põe a rodar a 100 km/h.

E diante de um cenário em que a economia brasileira está parada, faz-se então necessário pensar em meios alternativos para tirá-la da inércia.

Uma proposta neste sentido seria fazer com que o BNDES se desfizesse das muitas participações que possui em várias empresas públicas e privadas (o que não exige aumento de gastos), utilizando a receita auferida para retomar uma gama de obras de infraestrutura paralisadas (muitas delas há anos) pelo governo federal.

Além de produzir um verdadeiro efeito multiplicador ao gerar empregos diretos e indiretos, evitar-se-ia o desperdício dos recursos já investidos, constituindo-se em impulso para tirar a economia brasileira do estado estacionário em que se encontra.

Na atual conjuntura, é preciso ser criativo e fazer a roda começar a girar.

Orlando Assunção Fernandes

Orlando Assunção Fernandes é economista, mestre em Economia Política e doutor em Teoria Econômica pelo Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP).

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