Desigualdade e produtividade

05.06.2019

As relações entre desigualdade e produtividade são menos estudadas do que deveriam, embora exista ampla literatura sobre cada um dos temas. O Brasil é marcado por graves desigualdades e por lento avanço na produtividade do trabalho e na inovação – algo intrigante em plena era da revolução digital.

No que diz respeito à desigualdade, a divulgação pelo IBGE do relatório “Síntese de indicadores sociais”, em dezembro de 2018, confirmou algo que já era perceptível nas ruas: o biênio 2016-2017 registrou aumento da concentração de renda e da pobreza no Brasil, bem como relativa estagnação das condições da educação.

A pobreza extrema (até R$ 140 por mês) cresceu 12,7% em 2017 e a pobreza (até R$ 406) cresceu 3,7%, deixando 26,5% da população brasileira abaixo da linha de pobreza, pelos padrões estabelecidos pelo Banco Mundial. Crescimento lento da economia, ambiente negativo no mercado de trabalho e restrições aos programas de transferência de renda explicam a deterioração desses números.

A desigualdade da renda, medida pelo índice de Gini, também piorou no período. A razão entre os rendimentos médios do trabalho dos 10% com maiores rendimentos e os 40% com os menores rendimentos cresceu de 11,9 para 12,4. O fim da política de valorização do salário mínimo e a precarização do mercado de trabalho são apontados como principais responsáveis por esse aumento.

Já no que tange à produtividade, o relatório de 2016 da OCDE, “The Productivity-Inclusiveness Nexus”, aponta que, desde o início do século, 90% dos países desenvolvidos sofreram redução no ritmo de aumento da produtividade do trabalho, mas o caso brasileiro é ainda pior: se em 1991 a produtividade no Brasil correspondia a 33% da produtividade norte-americana, essa relação caiu para 28% em 2014.

Da mesma forma que a renda, a inovação, que é a fonte principal dos ganhos de produtividade, em vez de se difundir pelo conjunto da sociedade, vem se concentrando. Enquanto uma pequena minoria executa trabalhos de alta produtividade, a grande maioria dedica-se a atividades rotineiras, cada vez mais ameaçadas pelo próprio avanço da revolução tecnológica e digital.

Nesse contexto, o professor da USP Ricardo Abramovay, em artigo no Valor, mostra haver um vínculo perverso entre o avanço das desigualdades e a lentidão no crescimento da produtividade. “Não é o aumento da riqueza que pode trazer a redução das desigualdades. Ao contrário, é a redução das desigualdades que pode ampliar as oportunidades de os indivíduos participarem de forma criativa da vida econômica e, por aí, contribuírem para o aumento da riqueza”.

A desigualdade de renda afeta especialmente a capacidade dos mais pobres para investir em sua formação e na de seus filhos, perpetuando um crescimento abaixo do potencial na produtividade do país.

O relatório da OCDE não deixa dúvidas: “Em sociedades desiguais, domicílios de baixa renda têm menor capacidade de investir em educação e aproveitar oportunidades do que seus vizinhos mais ricos. Uma estratégia de produtividade que foque apenas nos negócios e nas inovações, ou que se apoie numa corrida para baixo via baixos salários, desmantelamento da proteção social ou condições inaceitáveis de trabalho para aumentar a vantagem competitiva de firmas e regiões, será em última análise menos efetiva que uma estratégia que também enfrente as desvantagens que impedem as pessoas de contribuir para uma economia dinâmica”.

Infelizmente as políticas desenhadas pelo governo brasileiro parecem caminhar na contramão de uma solução para esse problema.

Andrés Vivas Frontana

Andrés Vivas Frontana é economista, mestre e doutor em Teoria Econômica pela USP e professor da ESPM, no curso de Administração.

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