Demissões no Nordeste acendem alerta no setor

17.08.2018 - Mary Silva

Após uma recente sequência de fechamentos de indústrias no Rio Grande do Sul (casos Bottero, Crysalis, Di Cristalli e Universo Dakota), o clima de apreensão ganhou força no setor calçadista nacional. Com a instabilidade político-econômica do País, agravada pelas altas taxas de inadimplência e baixa no consumo doméstico, a cena se torna ainda mais nebulosa, exigindo, em alguns casos, medidas drásticas na gestão das empresas.

São reflexos que começam a ser sentidos na região Nordeste, onde se concentram diversas plantas fabris com matrizes no Sul e Sudeste do Brasil. Nas últimas semanas, pelo menos 300 trabalhadores teriam sido dispensados de seus postos na produção calçadista, conforme noticiou a imprensa local. Destes, 250 integram a folha do grupo Suzana Santos (São João Batista/SC), nos municípios de Itapetinga e Maiquinique, na Bahia.

Segundo o diretor da companhia, Cácio Picoli, a decisão vinha sendo maturada havia cerca de dois meses. “Foi necessário reduzir a produção diária nestas unidades, em função da situação difícil na economia. Eliminamos duas linhas específicas de produtos Renata Mello, que estavam com baixo giro, e não tínhamos mais como manter”, explica. Os profissionais, complementa ele, receberam aviso prévio há cerca de 15 dias. Com 11 unidades nos estados nordestinos, a empresa reduziu sua fabricação diária de 21 mil para 18 mil pares femininos na região.

As demais demissões teriam ocorrido em filiais da Lia Line (Nova Trento/SC), Vulcabras/Azaleia (Parobé/RS), no sudoeste da Bahia, e West Coast (Ivoti/RS), no Sergipe. Procuradas pela reportagem do Exclusivo, as duas primeiras afirmaram que as mudanças no quadro de colaboradores ocorridas em junho e julho foram pontuais, conforme necessidade (leia a íntegra dos comunicados no final da matéria). Até o fechamento desta pauta, a West Coast não havia dado retorno sobre o assunto.

Atenção redobrada

O risco de desequilíbrio econômico e agravamento do desemprego é um dos pontos mais sensíveis na pauta do governo baiano. Em algumas localidades, as fábricas de calçados são o único meio de geração de trabalho e renda para suas comunidades. Segundo a Secretaria de Desenvolvimento Econômico (SDE) da Bahia, a situação é monitorada de perto pelo Estado.

“O setor é um grande fomentador de mão de obra, em toda sua cadeia produtiva, na Bahia, e possui papel estratégico na indução da economia regional”, declara o órgão, por meio de sua assessoria de comunicação.

A pasta informa ainda que, segundo apurou junto ao presidente do grupo Suzana Santos, Almir dos Santos, a empresa analisa a possibilidade de produzir outro modelo em Itapetinga, evitando assim o corte de pessoal. “Ao governo do Estado, o empresário afirmou que terá uma definição concreta sobre essa alternativa em até 20 dias. Caso as demissões sejam efetivadas, serão tomadas providências imediatas para reverter a situação. Uma delas, seria a atração de novas empresas do setor para essa região, dando continuidade ao fomento de empregos no interior do Estado”.

Sobre as vagas na Lia Line e Vulcabras/Azaleia, a secretaria afirma não haver movimentos fora da normalidade.

Melhora somente em longo prazo

O presidente da Associação Brasileira das Indústrias de Calçados (Abicalçados), Heitor Klein, lamenta as baixas nos empregos do segmento no País. Ele ressalta a importância da indústria calçadista para o desenvolvimento econômico nacional. “A notícia é triste, ainda mais por ser seguida de outras semelhantes registradas em importantes polos calçadistas do Rio Grande do Sul. O fato é que o setor é intensivo em mão de obra, empregando, hoje, mais de 290 mil pessoas em todo o País.”

Como a demanda doméstica representa mais de 80% dos resultados do segmento, a realidade é de poucas esperanças de mudança em curto prazo, conforme o dirigente. “O alto endividamento já atinge mais de 60 milhões de brasileiros e as exportações, que poderiam diluir o problema, também não responderam a contento neste primeiro semestre. As empresas precisam diminuir o número de funcionários em função de uma capacidade ociosa cada vez maior – hoje estimada em mais de 30% no setor calçadista, e com perspectivas de aumento até o final do ano. Neste contexto de recessão, não existe uma fórmula mágica”, avalia.

A SDE baiana, entretanto, sustenta que não há crise no Estado. “São casos isolados que ocorrem devido ao momento delicado na economia do País. Há bons exemplos de que o setor está aquecido, como é o caso da Ferracini, que possui 300 empregados e quer dobrar sua produção no estado. Em Conceição do Almeida, o polo calçadista fez investimentos altos para produzir para a Arezzo. E a Calçados Pegada também ampliou, recentemente, sua linha de produção”, pontua a pasta.

Na Bahia, são concedidos incentivos fiscais e de infraestrutura às empresas, como crédito presumido de até 99% (resultando em taxa de ICMS de 1%), concessão e venda de espaço físico a preços subsidiados aos investidores, entre outros.

O que dizem as empresas em notas oficiais

Lia Line:

“Ao longo de todo o primeiro semestre, as unidades do Nordeste contrataram novos colaboradores para integrar os times da Lia Line, Sua Cia e Offline. Nos meses de junho e julho, foi necessário fazer um ajuste em algumas unidades e, por isso, ocorreram as demissões. Mas, no saldo, não representam um número expressivo dentro do exercício de 2018. Esse ajuste está diretamente ligado ao tipo de produto produzido. No inverno, temos produtos que exigem uma mão de obra mais intensificada; já no verão conseguimos uma velocidade maior. Hoje nossa equipe conta com mais de 3.200 colaboradores e busca, cada dia mais, contribuir com o desenvolvimento da região.”

Vulcabras/Azaleia:

“Posicionamento – Demissões na Bahia
A Vulcabras Azaleia informa que não foram fechados postos de trabalho na Unidade de Itapetinga, na Bahia. Ciclos de substituições e contratações de profissionais são naturais dentro da empresa, que hoje conta com mais de 14.000 funcionários.”

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