Visão realista da crise - parte 2

03.08.2016
Ninguém desconhece o elevado grau de competitividade registrado na comercialização de calçados, no mercado interno, decorrente, principalmente, do desequilíbrio ainda insuperável entre a expansão moderada do consumo e a capacidade elástica da oferta. Por aí se pode entender o fato de que, no processo das negociações do produto, o calçadista representa, no geral, a parte mais vulnerável, notadamente em períodos de retração mais acentuada do mercado.
Quanto às exportações, o contraponto negativo aos esforços e estratégia de conquista do mercado externo é representado pela instabilidade que tem caracterizado de longa data a política cambial brasileira. Em função disso, até mesmo o promissor ciclo de exportações – que sugere parcerias efetivas com importadores de expressão – tem enfrentado pontos de estrangulamento e solução de continuidade, em detrimento de parcela considerável de importantes indústrias exportadoras. Incluindo algumas pioneiras na modalidade.
Conta-se, ademais, o efeito colateral da redução inesperada da corrente de exportações: aquele em que, em decorrência dos gastos adicionais em modernização para enfrentar a competição internacional, acaba por pressionar os custos dos calçados destinados ao mercado interno, ao romper o equilíbrio das fatias de produção programadas para atender aos dois mercados.
Merece ainda um exame à parte, pela sua relevância, a constatação de que, em nível federal, historicamente o governo central não tem dado a devida importância ao conjunto das indústrias caracterizado pela forte ocupação da mão de obra. Delas, as autoridades responsáveis demonstram ter uma visão muito estreita e até equivocada, em relação à implantação de uma política industrial consciente e bem formulada, sempre que é levado a tratar do assunto.
Mesmo diante da concorrência dita predatória praticada por países asiáticos nas suas exportações de sapatos para o Brasil, nosso governo tem se mostrado recalcitrante quanto a medidas racionais, certamente em razão da importância estratégica, principalmente da China, para a nossa balança comercial. Porém, sem cuidar de medidas compensatórias para o caso.
E, a propósito, é prudente que o setor calçadista se atente para o fato de que, a partir do final dezembro deste ano, a China passará a ser tratada como economia de mercado com o aval da OMC, União Europeia e Estados Unidos. Aí então, nas acusações de dumping, a imposição de possíveis sobretaxas compensatórias passarão a enfrentar maiores dificuldades. O que irá certamente refletir nas taxas de represália ainda vigentes.

Luís Carlos Facury

Luís Carlos Facury é economista e professor universitário (Economia Internacional), jornalista e calçadista.

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